A invenção de uma bela velhice.

Foto: Divulgação

Por: Mirian Goldenberg

Desde 2007 estou realizando a pesquisa “Corpo, envelhecimento e felicidade” com 1.700 homens e mulheres de mais de 60, 70 e 80 anos. Atualmente estou pesquisando aqueles que já passaram dos 90 anos. E o que os meus pesquisados me ensinaram sobre essa fase da vida?

Foto: Divulgação

Na bela velhice, os homens querem continuar sendo úteis, ativos, produtivos. Não querem um trabalho só por obrigação ou só para ganhar dinheiro. Eles querem ter tesão no que fazem. O lema para uma bela velhice poderia ser: Eu não preciso mais, mas eu quero. Os homens também querem ter tempo para curtir a casa, a família, a esposa, os filhos e os netos. Querem ter mais tempo para o mundo do afeto que não puderam aproveitar quando eram mais jovens e estavam preocupados em ganhar dinheiro para sustentar a família.

As mulheres brasileiras querem liberdade. Quando perguntei para as mulheres mais jovens o que elas mais invejam nos homens, elas responderam, em primeiro lugar, liberdade. Em segundo lugar elas disseram fazer xixi em pé. Quando perguntei aos homens o que eles mais invejam nas mulheres, eles responderam simplesmente: nada.

No entanto, muitas mulheres de mais de 60 anos me disseram: É a primeira vez na vida que eu me sinto livre, é a primeira vez que eu posso ser eu mesma. É o melhor momento de toda a minha vida, nunca fui tão feliz. E como elas conquistaram a liberdade tão desejada?

Foto: Divulgação

Em primeiro lugar, elas fizeram uma verdadeira faxina existencial. A faxina não é só jogar fora as roupas que não servem mais, os cacarecos, as coisas que não queremos mais em nossas vidas. Isso é o mais fácil. A faxina existencial é tirar das nossas vidas aquelas pessoas que nos fazem mal, que só criticam, que sugam a nossa energia: os verdadeiros vampiros emocionais.

As mulheres falaram muito da importância das amigas na bela velhice. São as amigas que cuidam, que escutam, que conversam, que levam ao médico, que telefonam para saber como elas estão. Elas falam mais da importância das amigas nessa fase da vida, do que do marido, dos filhos e dos netos. As amigas são a família escolhida.

Elas também aprenderam a dizer não. As mulheres mais jovens têm muita dificuldade para dizer não, querem agradar todo mundo e não têm tempo para elas mesmas. Mais velhas, passam a priorizar o tempo para elas. Esta mudança de foco é uma verdadeira revolução.

Elas também aprenderam a rir e brincar muito mais. 60% das mulheres mais jovens que eu pesquisei invejam a capacidade masculina de rir de qualquer bobagem. Eu perguntei: por que vocês não riem mais? Elas responderam: porque eu não tenho tempo, porque eu tenho medo do que os outros vão pensar. Na bela velhice as mulheres brasileiras se sentem mais livres para rir, brincar e sonhar muito mais.

Quando penso na invenção de uma “bela velhice”, penso na geração que foi jovem nos anos 1960 e que está começando a envelhecer. Geração que reinventou a sexualidade, o corpo, as novas formas de casamento e de família. Geração que teve como centro a busca do prazer e da liberdade sexual, a recusa de qualquer forma de controle e de autoridade e a defesa da igualdade entre homens e mulheres. Geração que não aceitará o imperativo “seja um velho!” ou qualquer outro tipo de rótulo que sempre rejeitou e contestou.

Mirian Goldenberg está na série LIVRO VIVO, do Canal Philos, no episódio “A invenção de uma bela velhice”. Ela é antropóloga, Professora Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de “A bela velhice” (Ed. Record)


Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *